Porque devemos rejeitar a manobra da reitoria e dos antigreve

Os estudantes da Unifesp estão há mais de sessenta dias em greve. O cenário político em que esta greve se desenvolve, no entanto, mudou radicalmente nos últimos dias. Os professores universitários decidiram, em escala nacional, por uma greve pelo atendimento de suas reivindicações e por melhores condições de ensino para as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES). Esta greve tem mais de 70% de adesão (principalmente por parte dos professores) e, diante disso,  propostas como aqueles que sugerem o fim do nosso movimento é, queiram os autores da proposta ou não, a tentativa de enfraquecer uma luta nacional em defesa da educação  que tem se fortalecido a cada dia que passa.

O fato de neste momento mais de quatro dezenas de universidades estejam se mobilizando em defesa da educação pública mostra, entre outras coisas, que a decisão dos estudantes de Guarulhos de lutarem e manterem a greve até agora foi um grande acerto. Mostra, inclusive, que não estamos isolados. Os problemas que enfrentamos são os mesmos de dezenas de milhares de estudantes, professores e funcionários e a nossa vontade de lutar, expressa sobretudo na greve, também é a mesma daqueles que agora estão realizando um dos maiores movimentos de luta dos últimos anos nas universidades federais.       Há semanas o número de federais em greve vem aumentando e conjuntamente com a paralisação das atividades acadêmicas estão também as ocupações, em especial ocupações de reitorias.

No quadro específico da Unifesp, temos de todos os seis campi paralisados e apenas o de Guarulhos sem participação dos docentes neste movimento de luta. Em nosso campus quem tem garantido a paralisação das aulas são os estudantes. E os poucos professores da EFLCH que já tem percebido a importância dessa greve estão recebendo pressão de seus próprios “colegas”. Ou seja, em Guarulhos temos a seguinte contradição: no mesmo campus estão reunidos o setor mais combativo do movimento estudantil e a ala mais conservadora dos professores. Esta contradição precisa ser debatida por todos os interessados nas questões políticas da EFLCH e, principalmente, por quem quer que a greve se desenvolva para que possamos conquistar nossas reivindicações.

Como se não bastasse o fato da minoria dos professores de Guarulhos favoráveis a greve terem de convencer os doutores da Humanas quanto à paralisação nacional, há uma parcela de estudantes que, de maneira consciente ou não, querem isolar ainda mais esse pequeno grupo de docentes quando vão à assembleia com o único objetivo de acabar com a greve.

Os docentes não podem furar a greve estudantil e vice-versa     

A associação entre alunos e professores para a realização de aulas é, ou pelo menos deveria ser, um acordo livre onde uma parte respeita a outra. Por isso, durante a greve dos estudantes o movimento diversas vezes insistiu no fato que os professores que tentavam furar greve cometiam um ato autoritário. Se os alunos, por meio de uma decisão soberana de sua assembleia, decidiram paralisar as aulas, o contrato entre as duas partes (docentes e discentes) para que as aulas sejam ministradas foi rompido. E, como em qualquer associação livre deste tipo, a ruptura de uma das partes já é suficiente para o fim do contrato. Ou seja, os docentes não podem obrigar os alunos a irem para as aulas se estes, em um ato político, decidiram paralisar as aulas. Muito menos podem obrigá-los por meio de coerção com chantagens como, por exemplo, punições ou retaliações acadêmicas com aplicação de faltas e reprovação na disciplina. A greve estudantil significa que os estudantes decidiram por uma ausência de aulas, e não por uma ausência às aulas como alguns professores e a reitoria, de forma maliciosa, tentaram insinuar.

Dessa forma, criticamos os professores que tentaram furar a greve e classificamos seus atos como a tentativa de cassar um direito democrático, o direito dos alunos entrarem em greve. Os alunos precisam ter suas decisões respeitadas, sobretudo suas decisões políticas.

O mesmo critério vale para os alunos em relação aos professores. Se os professores decidem pela greve os alunos não podem, sob qualquer pretexto, querer forçar os professores a darem aula. Neste sentido, a continuidade da greve estudantil deve acontecer, entre outras coisas, para que os alunos não desrespeitem a greve nacional dos docentes universitários.

Por isso, qualquer votação contrária à continuidade da greve estudantil, ou seja, pelo retorno às aulas, é, neste momento, um ato antidemocrático porque os alunos estariam furando a greve docente e, pior ainda, um movimento nacional em defesa da educação.

Qualquer pessoa que defenda os direitos democráticos, em atos e não meramente em palavras, só pode conceber o retorno às aulas quando docentes e discentes, por meio de suas decisões políticas, se manifestarem pelo fim de ambos os movimentos de greve. E, mais do que isso, qualquer pessoa que defenda a educação pública, também em atos e não meramente em palavras, só pode conceber o retorno as aulas quando este movimento nacional que surgiu conseguir ser vitorioso e conquistar uma melhor qualidade de ensino para todos.

Fortalecer um movimento nacional em defesa da universidade pública

Além disso, é importante ter claro que uma vez que mais de setenta por cento das universidades federais estão paralisadas, a greve geral já é uma realidade. Àqueles, sejam professores ou estudantes, que se oponham a este movimento não estão furando qualquer greve, mas a greve nacional: é ir contra uma luta que diz respeito não apenas a professores e estudantes, mas que defende questões importantes para todo o País e sua população

Imaginem a cena: um único campus em uma universidade de seis campi com greve estudantil, caminhando para setenta dias de mobilização, encerra a greve dos estudantes sem negociação. No segundo ato da cena, depois de uma votação incoerente, ilegítima e covarde (em relação a abandonar o movimento nacional) todos vão acompanhar pela internet a quantidade de federais beirando os 100% e o número de reitorias ocupadas triplicando.

Uma cena que não cabe à política, somente a um filme de ficção, com um “roteiro-Frankenstein”, pois começo, meio e fim não se encaixam.

Por fim, a assembleia do dia 24 de maio de 2012 da Unifesp Guarulhos tem uma responsabilidade nacional em relação à greve. Os estudantes de Guarulhos deram o ponta-pé inicial na Unifesp e nacionalmente a esta luta. Por que razão devemos abandoná-la agora que ela está se espalhando para todo o Brasil e atinge seu momento de maior intensidade?

Nossa única possibilidade é continuar avançando com a greve!
(A.L.M. e L.N.C. – estudantes da Frente 05 de Maio) 

Reocupar a diretoria acadêmica

Depois de mais de sessenta dias de greve, a reitoria da Unifesp tem se mostrado intransigente com o movimento estudantil. Nega-se a abrir negociações e atender as pautas de reivindicações que, entre outras coisas, contêm a construção de um prédio e melhorias nas condições de ensino e permanência. A reitoria, inclusive, se negou até mesmo a comparecer em uma mera audiência pública na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).

Em primeiro lugar, esta atitude mostra que os dirigentes da universidade estão em total oposição à maioria da comunidade universitária que há anos aponta que as condições atuais da EFLCH são insuficientes e, que a política levada adiante pelas seguidas gestões, estão inviabilizando a continuidade das atividades acadêmicas.

Em segundo lugar, esta intransigência da reitoria precisa ser debatida pelo movimento estudantil que deve, no marco desta luta que vem sendo travada, superar esse quadro, ou seja, impor uma derrota à reitoria e fazer com que seus direitos sejam atendidos.

Porque ocupar

Nesta greve, já tivemos a experiência de uma ocupação e ela deixou várias lições. Mostrou que a ocupação é um método muito mais contundente de pressionar a reitoria, que entrou em um verdadeiro estado de pânico com a atitude dos estudantes e tentou de todas as formas retirar as pessoas da diretoria acadêmica.

Isto ocorre por diversos motivos.

Um deles é o fato de que a greve estudantil, embora já seja um ato político importante conduz, inevitavelmente, os estudantes a certa dispersão. Os estudantes pelo “simples” fato de estarem parados não geram nenhum prejuízo material para a universidade. Diferente de uma greve operária em uma fábrica onde a paralisação da produção se traduz em perdas financeiras.

Por isso, em uma greve de estudantes um dos aspectos fundamentais são as manifestações que ou questionam o regime de poder ou dão visibilidade para o movimento como, por exemplo, atos de rua.

A ocupação por sua vez, também significa que parte da própria administração da universidade passa temporariamente para a mão dos estudantes, o setor mais progressista da comunidade acadêmica. Desta forma, a ocupação é, ao mesmo tempo, uma forma de pressão sobre a burocracia universitária e, no caso da greve da Unifesp, o início de um debate sobre as verdadeiras raízes dos problemas como a falta de políticas de permanência, infraestrutura precária, normas ditatoriais contra a atividade política dos estudantes etc.

Por outro lado, a ocupação também ajudaria a romper o cerco montado pela grande imprensa que não noticia nosso movimento para poupar a prefeitura de Guarulhos, dirigida pelo PT, às vésperas das eleições municipais.

Ocupar quando?

A ocupação é, antes de tudo, uma necessidade do movimento. Não se trata de um mero desejo de um grupo de pessoas. A ocupação seria uma grande resposta contra a reitoria que, cada vez mais, vem buscando minar o movimento e, inclusive, claramente buscando influenciar até mesmo estudantes. Na última assembleia, por exemplo, a diretoria acadêmica de Guarulhos, montou toda uma operação para acabar com a greve. A operação incluiu, entre outras coisas, carta endereçada à casa dos estudantes, disponibilização de ônibus até mais tarde para garantir a presença dos antigreve (curioso é que não notamos a mesma disposição de superar os problemas de acesso em época de aula!), pressão dos professores, entre outras coisas.

Neste sentido, pedir calma e postergar de forma ininterrupta a ocupação da diretoria acadêmica é dar força para a reitoria que, livre da pressão da ocupação da diretoria, pode articular mais facilmente o fim da greve com os professores e alunos que concordam com ela.

Por isso, é preciso reocupar a diretoria o mais rápido possível, na primeira oportunidade em que isto for possível. A ocupação não é uma maneira de garantir a greve e impulsionar o movimento. Trata-se do caminho natural de um movimento que, desde o seu primeiro dia, vem superando diversos obstáculos e ameaças e, em mais de dois meses, derrotou seus inimigos um a um.

A.L.M., estudante da Frente Cinco de Maio

Nota de esclarecimento

Sobre a polêmica publicação da carta do coletivo de estudantes organizados na frente 5 de maio, vimos para esclarecer que a posição da comissão de comunicação é de manter a publicação no blog, visto que de forma coletiva julgamos que a publicação está no local correto e que deve ter seu espaço no blog como todas as cartas escritas por coletivos desde então.

É importante ressaltar que defendemos a publicação de todo tipo de manifestação de opinião, seja coletiva ou individual, independente do seu posicionamento político. O espaço para o debate e a crítica é a aberto e até o momento tem sido garantido os comentários para livre expressão dos estudantes. Obviamente que isso tudo deve ocorrer dentro de alguns limites e textos de cunho machista ou preconceituoso não serão publicados.

Também garantimos o direito de resposta a qualquer grupo que tenha se sentido prejudicado em qualquer publicação, para isso é só enviar uma carta-resposta ao e-mail da comunicação: greveunifesp@gmail.com

Terminamos a nota ressaltando a importância da transparência e da livre-expressão para construção de um debate sólido entre os estudantes do movimento.

Carta da Frente 5 de maio

A ocupação acabou: quem está comemorando?

o movimento entrou pelos fundos e saiu pela porta da frente, e desocupando sem saber que estávamos sendo desocupados

A Reitoria, que recebeu o movimento semanas atrás com a tropa de choque, e que não atendeu a nossa pauta de reivindicações, tem aplicado uma série de ataques aos estudantes em greve, desde o dia 22 de março, tem realizado uma tática orquestrada de terror como forma de intimidar os estudantes que, em greve, ocuparam a diretoria acadêmica do campus Guarulhos na noite do dia 02 de maio, depois de 42 dias de greve. Essa tática foi se intensificando desde o início da ocupação: através dos membros do PRAE, que tem uma forma habilidosa de realizar a política da reitoria, sob um véu de “estar ao lado dos estudantes”, quando na prática, esse setor da burocracia universitária deu um ultimato para tentar desocupar, tentando pressionar o movimento, visando evitar agravar a crise política na Universidade, e não precisar colocar a Tropa de Choque dentro do campus.

Na 5af (03/05), houve o estopim dos ataques aos estudantes: na reunião da comissão de diálogo do Comando de Greve com a PRAE, a posição da reitoria era de não negociar com o movimento enquanto estivesse em greve (sic!) e as punições ao movimento grevista foi deliberado na Congregação do campus Guarulhos, aprovando abertura de sindicância sob alegação de violência, insulto, desacato e obstrução ao exercício da função. Assim, em Plenária Aberta do Comando de Greve, os estudantes responderam aos sucessivos ataques à luta pelas reivindicações, ocupando a diretoria acadêmica do campus, em uma votação que passou por contraste.

Um impulso acertado do movimento foi dado. Tanto que poucas horas de ocupação fez com que a Reitoria acenasse, mesmo que timidamente, um recuo, aceitando negociar com o movimento, ainda que não aceitasse vir até o campus, sem falar que o movimento teve visibilidade até na imprensa burguesa. A ocupação, como continuidade da greve, foi um passo acertado e consequente com a luta pelas reivindicações, e pela pressão para o atendimento das pautas.

Os estudantes que chegaram ao campus na 6af, dia 04 de maio, que viram com seus próprios olhos a ocupação da Diretoria, se manifestavam, em sua maioria, favoráveis à ação, inclusive com falas no Comando de Greve, de estudantes que iriam levar a defesa da ocupação para maiores horizontes. Isto é, a ocupação foi ganhando cada vez mais adeptos. Além disso, cabe ressaltar, que nessa Plenária do Comando, foi consenso continuar com a ocupação.

Uma prova concreta da força do movimento é que a questão da continuidade da ocupação foi debatida de forma permanente, nas 44 horas em que os estudantes permaneceram ocupados na Diretoria. Esse debate surgiu em 8 momentos, e em todos eles, a questão da continuidade da ocupação ganhou: ou por consenso, ou por ampla maioria, ressaltando a força unitária da luta da greve com ocupação. Em reunião aberta no pátio após as pressões da PRAE na 6af pela tarde, os estudantes, em sua maioria, apoiaram a ocupação e sua continuidade; nos debates dentro da ocupação, a posição majoritária era pela continuidade; no sábado, antes e pós entrega do mandado de citação e intimação, anunciando a reintegração de posse, a plenária posicionou-se pela permanência na ocupação até a reintegração, ora de forma unanime, ora por maioria dos votos. Ou seja, em 8 momentos onde se discutiu a questão de desocupar, em nenhum momento essa proposta foi aprovada.

Um setor levou adiante a traição: a Reitoria não precisou da Tropa de Choque, setores do movimento fizeram esse serviço

Contudo, mesmo após a insistência de colocarem a questão de desocupar a Diretoria, e perder em todas as votações, um setor rompeu com a unidade, fazendo de tudo para desocupar. Esse setor, que se utilizava de “informes terroristas”, e tentavam ganhar no grito, foram os agentes responsáveis pelo acordo com membros da Reitoria e da Polícia Militar, que estavam no portão da Universidade, do lado de fora. Na 6af, o PSTU já defendia abertamente desocupar a Diretoria em troca da proposta trazida pela PRAE. No sábado, como era esperado, não havia nem sombra deles na ocupação. Contudo, o papel de traição foi continuado pelo PCB e pelo PSOL. Esses dois partidos, que estavam na ocupação, e que perderam na última votação, ignoraram uma construção de unidade, e foram agentes no acordo feito com membros do PRAE de desocupar após fazer o inventário, sem ter a reintegração de posse. Esses partidos dirigiram uma ação em favor da Reitoria: não precisar da tropa de choque para tirar os estudantes. Esses setores que dirigiram essa traição são responsáveis pelo modo como houve a desocupação, muito diferente dos que foram induzidos, pela pressão, a tal atitude.

Isso ressalta que a desocupação foi uma ação que foi contra a própria orientação do Comando de Greve de 6af (04/05) e das discussões da ocupação. Assim, a ação desse setor que deu um golpe na ocupação, fazendo um acordo com a PRAE-Reitoria, foi um ataque frontal, não somente contra as pessoas que defendiam a ocupação no dia da intimação, mas um ataque ao Comando de Greve, que se posicionava pela continuidade da ocupação.

É preciso ter clareza dos fatos, debate-los, e abrir uma crítica aberta sobre o ocorrido, pois o que está em jogo é a condução da luta pelas reivindicações, o combate aos ataques da burocracia universitária e a confiança ideológica e política nos companheiros estudantes envolvidos nessa mobilização. A ocupação acabou: quem está comemorando? Certamente não são os estudantes que lutam pelas pautas de reivindicações. Mas alguns estudantes, ao saírem, entoaram um aviso: VOLTAREMOS!

Assinam essa carta os membros da frente 5 de maio.